Para acelerar a recuperação econômica após a pandemia do coronavírus, o Brasil deve inserir o mecanismo do “fresh start” na Lei de Falências (Lei 11.101/2005). Essa é a opinião de advogados ouvidos pela ConJur.
As medidas que vêm sendo tomadas pelo governo federal para ajudar empresas, como o aumento de linhas de crédito, a possibilidade de redução de salários e o adiamento de tributos não são suficientes para compensar a redução drástica no consumo de bens e serviços — especialmente de micro e pequenas empresas, avalia o presidente do Instituto Brasileiro da Insolvência, Bruno Rezende.
Dessa maneira, opina, é preciso conferir a esses empresários a possibilidade de um “fresh start” (rápido recomeço). Ou seja: permitir que eles fechem seus negócios ou os repassem a terceiros e se livrem rapidamente das dívidas. Dessa maneira, podem voltar a empreender mais rapidamente do que ocorre hoje no país. Hoje a Lei de Falências proíbe o falido de exercer qualquer atividade empresarial a partir da decretação da falência a sentença que extingue suas obrigações. Só que esse intervalo costuma demorar anos.
A medida consta do substitutivo que visa a reforma da Lei de Falências (PL 10.220/2018) — Bruno Rezende é consultor do projeto para o deputado federal Hugo Leal (DEM-RJ), relator dele. O texto atualiza a Seção XII do Capítulo V da Lei de Falências, que trata do encerramento e da extinção das obrigações do falido, para facilitar sua volta ao mercado.
Isso é possível porque o PL 10.220/2018 esclarece que a data inicial para reinício do prazo prescricional corresponde, inclusive para as Fazendas Públicas, ao trânsito em julgado da sentença de encerramento da falência. Uma vez terminado esse prazo, as Fazendas Públicas extinguirão as dívidas, não apenas as cobranças judiciais, como ocorre hoje em dia. A alteração permite que o empresário possa usar seu próprio CPF para iniciar um novo negócio, sem que ele fique preso à empreitada anterior.
Além disso, o projeto autoriza a pessoa física que for sócia ou administradora do devedor a requerer que lhe sejam estendidos os efeitos da falência, declarando-se solidária e ilimitadamente responsável pelas dívidas do falido. Com isso, pode obter os benefícios de pessoa natural falida, que poderá pedir ao juízo da falência que as obrigações a ela referentes sejam declaradas extintas por sentença.
Por isso, Bruno Rezende defende uma rápida aprovação do PL, que contém outras medidas para ajudar empresas a se recuperar de forma mais rápida e eficaz, como o encurtamento do prazo de prescrição das obrigações e a criação de procedimentos de parcelamento de dívidas, como a transação fiscal.
Projeto tímido
O advogado Roberto Carlos Keppler, sócio-fundador da Keppler Advogados Associados, também entende que a inserção do fresh start na Lei de Falências ajudaria empresários a se recuperarem mais rapidamente da crise econômica causada pelo coronavírus. No entanto, Keppler afirma que o PL 10.220/2018 é muito tímido nesse sentido. Isso porque somente reduz de cinco para três anos o período de suspensão das cobranças — e após o transito em julgado da sentença que decretar a falência.
“Nesse sentido, considerando a necessidade de se aguardar pelo transito em julgado, que, aqui no Brasil, costumar demorar décadas, o que se observa é um projeto de lei que não cumpre àquilo a que se propõe. Um desperdício, infelizmente. Ou seja, uma vez mais, o Poder Legislativo perderá a oportunidade de modernizar a contento a legislação falimentar brasileira, em conformidade com aquilo que se observa em países desenvolvidos”, avalia o advogado.
Medidas emergenciais
O deputado federal Hugo Leal (PSD-RJ) apresentou na quinta-feira (2/4) o Projeto de Lei 1.397/2020. A proposta institui alterações temporárias na Lei de Falências para diminuir os efeitos da pandemia do coronavírus em empresas.
O texto flexibiliza os requisitos para os pedidos de recuperação judicial e extrajudicial. O projeto prevê que o empresário tente renegociar suas dívidas em até 60 dias. Nesse período, a empresa fica protegida de atos expropriatórios, como execução de garantias e bloqueio de bens. Apenas se a companhia não conseguir sobreviver a esse período é que deve pedir recuperação ao Judiciário.
A proposta também beneficia as empresas que já se encontram em regime de recuperação judicial, uma vez que inibe a decretação de falência por descumprimento das obrigações constantes no plano de recuperação judicial, veda a retirada de bens essenciais das empresas em recuperação judicial, proíbe a execução de coobrigados e autoriza a renegociação de planos já aprovados e em vigor.
“Essas são medidas hábeis para proteger a cadeia produtiva, visto que preservam a entidade produtiva, os postos de trabalho e o capital empenhado, o que trará de volta o horizonte de continuidade da economia, em meio ao caos provocado pela pandemia”, opina Roberto Keppler.
Bruno Rezende também elogia o projeto. “O PL fomenta a conciliação extrajudicial preventiva — desafogando o Judiciário — e é uma ferramenta jurídica salutar para o fomento e recomposição da economia que contribuirá para a manutenção dos empregos e das atividades comerciais em tempos de calamidade pública e crise acentuada ocasionada pela covid-19”.